quarta-feira, 27 de abril de 2011

Coletivo

Eu sei, o automóvel é um dos grandes ícones – para usar uma palavra da moda – do capitalismo. Sonho de consumo a alimentar desejos e que fascina especialmente aos homens. Inegável a utilidade do carro: facilita a locomoção, faz com que se chegue mais rápido, você controla a trilha sonora, sem contar que dá até para comer no carro... Uma maravilha! Mas quer saber, adoro igualmente coletivos. Ou melhor, gosto da atmosfera, de ver pessoas e ouvir o que elas andam falando. Sim, por que não?! Certa curiosidade em relação “ao outro”, no meu caso, é pressuposto básico de trabalho (mas, deixemos de lado certas “pessoalidades”), e de mais a mais, alguns cronistas de verdade, como Machado de Assis e Lima Barreto possuem grandes histórias embaladas pelos solavancos de carruagens e bondes.
Mas outro dia foi exagero, quase uma síntese do gênero humano dentro daquele ônibus. Viagem longa e enfadonha, se não fosse algumas pérolas, que de tão edificantes merecem serem aqui compartilhadas.

Para começar, uma senhora, digamos, tamanho GG saca um celular para fazer uma ligação:
- Oi querida, e aí? Vou para sua terra semana que vem. Mas me diga, qual é seu número agora, porque vou comprar-lhe uma blusa ...
- Nossa! Isso tudo! Ta igual a mim, uma baleia!
“A adoro ela, é uma das minhas melhores amigas”. Confessou ternamente para a senhora que sentava ao seu lado.
Esses tipos sinceros são os mais comuns. Imagina se ela não gostasse da “amiga”, não haveria nem a blusa nem tampouco o elogio tão afável.
Outro tipo absolutamente comum é aquele que adora contar coisas muito, muito pessoais a qualquer desconhecido que esteja próximo. Nesse quesito vale tudo: reclamar de dívidas; que o marido “não comparece”; que a filha se envolveu com um maconheiro que tirou a virgindade dela e foi embora...
A afirmação do mundo burguês e do racionalismo científico deve ter alguma culpa nisso – entre outras, naturalmente. Os sacerdotes andam meio desacreditados e não temos muito tempo para ter ou nos relacionar com nossos amigos, preocupados que estamos em ganhar e gastar dinheiro. Dessa forma ou recorrermos aos psicólogos (para gastar mais dinheiro em troca de sermos ouvidos) ou inconscientemente – Freud explica? – as pessoas andam descarregando esse tipo de coisa ao rodar a roleta do ônibus, o grande divã das camadas populares, que catarticamente expiam e ouvem os problemas de sua existência.
“No tempo da revolução não era essa bagunça...” Nossa! Ainda bem que essa eu não ouvi inteira. O tipo reacionário que sente saudades das atrocidades e desatinos da ditadura militar também anda por aí à solta. Cigarra tocando! Meu ponto! Estou salvo! Mas essa foi apenas à ida. O que me aguarda na volta?

Um comentário:

Bárbara Zdanowsky disse...

Rá! Adorei!
Li no trabalho e foi o único momento que pude sorrir pro meu chefe!

Comentário Rápido