sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

A CERTEZA DO INEXATO

"Se alguém souber dizer o que é o amor, esse alguém não sabe o que é amor". Pensando nessa frase, fui dormir. Dormi questionando como podemos ter tanta convicção de um sentimento que não temos a capacidade de precisar - pois desde a formação da Terra se fala sobre ele, discute-se sobre ele, formam-se definições dele, várias definições, escreve-se sobre ele, canta-se dele - ao mesmo tempo em que temos a certeza de que precisamos dele.

Posso, a partir daqui, ser clichê e piegas como as músicas de Roberto Carlos, ou tentar simplesmente refletir sobre essa sensação tão maravilhosa e arrebatadora. Amar alguém, não só no âmbito sexual, mas demonstrar carinho, respeito, compaixão para com o outro, é o que confere essa maravilha e esse arrebatamento.

Amar é o sentimento mais profundo que conhecemos, por isso após milênios ainda não nos aprofundamos o bastante. É algo tão incerto, metamórfico, que dizer palavras adolescentes numa música feita para venda e audiência em massa não é o suficiente. Amar é muito mais, e sempre mais. É saber que sempre existirá uma razão e sentido para a vida, mesmo quando o mundo estiver ao contrário. É ter certeza que encontrará naqueles braços o calor necessário para o frio siberiano. É saber que mesmo quando faltam palavras, um gesto pode mudar o destino de um dia, uma semana, um mês, um ano. De uma vida. É ter a certeza do inexato, indefinido e inconcluso apenas porque você se sente seguro. Tudo por causa dequeles braços, daquele abraço. É uma tempestade num dia ensolarado enquanto calmaria num mar agitado.

Passaremos os próximos anos, até o fim do mundo, tentando defini-lo, pois não temos respostas científicas para ele, só conhecemos os seus efeitos, e, enquanto sentimento for, como sentimento o cultivaremos e continuaremos em busca da frase perfeita, do poema ideal, da música que faz chorar, mas ainda choraremos daqui a centenas de milhões de anos, porque, sendo inexato, de diferentes maneiras se apresenta e de diversos modos o conhecemos. Por isso ele é tão rico e, graças a Deus, por isso nunca saberemos o que o amor realmente é. O que importa é o que ele representa para cada um.

"Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe porque ama, nem o que é amar
Amar é a eterna inocência,
E a única inocência, não pensar..."
(O Meu Olhar - Alberto Caeiro, heterônimo de Fernando Pessoa)

O que o amor representa para você?

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Segundas de Literatura XXVIII

Há tempos que não fazia tal pesquisa para essa coluna. Como foi bom retornar a ela.
MAS AÍ SEGUE, JOÃO UBALDO RIBEIRO, à época do lançamento de O Pássaro Azul.

sábado, 25 de dezembro de 2010

Abstinência

            Tenho sido um péssimo colunista. Até mesmo como mantenedor intelectual aqui do grupo, deveria dar mais o exemplo de escrever dentro dos limites aqui pedidos e publicar, publicar e publicar. Mas quem disse que consigo? Quem disse que o mundo deixa que eu publique? Por sorte, como um elo com o bom senso, aqueles que acompanham o site vêm sempre aqui, mas não se colocam como agentes de uma cobrança que geraria o nervosismo para a produção do texto. Hoje o escrevo, por conseguir ter um simples minuto de respiração. Mas não vou negar que me abstive de minha responsabilidade como colunista.
            A principal causa se dá pelo fechamento de notas ao fim de ano, um problema comum a qualquer professor nesse período de quarto bimestre, ou momento de total desespero de todos por todas as partes. O mundo fica muito acelerado nesse período, e nós, professores, somos cobrados de todas as escolas ao mesmo tempo. Não vou negar, esse foi o principal motivo. Só que me há uma cobrança pessoal, íntima, na tentativa de concluir o meu romance. Todo santo dia abro o mesmo arquivo, leio e releio e me forço a escrever uma página por dia. Isso já é algo que faço há algum tempo, tenho que escrever uma página por dia e ler dez páginas de algum livro importante. Com esse período de fechamento de notas, essa organização pessoal tem também sido deixada de lado. A leitura, porém, consegui equilibrar; a escrita, não. Sou muito, mas muito lento para escrever. Acho que pelo excesso de detalhes, minúcias literárias, todo aquele floreio que julgo importante ter, já disse aqui, sou fã incontestável das metáforas, das redondilhas (dialéticas), dos parágrafos enriquecidos e não limitados em si mesmos. Escrever uma página é um custo violento. Um problema que não tenho com as crônicas.
            Hoje estou nessa crônica aqui, dialogando com o título a ideia de ausência, de algo que não houve de ser feito e que tem me gerado uma saudade. A crônica é uma saudade, o humor tranquilo, mediocritus, também me é saudade. Uma saúde mais simplificada é outra. Tenho andado doente o mês inteiro, até por causa da saudade de minha avó Nancy, que faleceu início desse mês. Uma morte ainda não digerida, talvez nunca. Só mantive semanalmente a minha coluna no Trema Literatura, por causa da cobrança editorial.  Estou com abstinência de uísque, abstinência de ter a sensação do término de um texto, abstinência de ter uma ideia para um conto, esse ano terei abstinência das comidas natalinas – meu trato digestório limitou-me a frutinhas pouco robustas – abstinência de não ficar no banheiro, de não ter dor no estômago, abstinência de poder viver a escrita de uma poesia.
            Por sorte, terei abstinência da violência, do medo constante de andar no Rio, da minha barriga sempre a frente de algo muito pessoal, da minha conta no negativo, de algumas pessoas ruins que passaram na vida esse ano, da negatividade de um ambiente ruim de trabalho, do medo de perder o emprego, do chefe escroto que todos abominam a ponto de seu nome não ser proferido na Região em que moro. Só sinto também que 2010 passou muito rápido, tive pouco tempo para curtir algumas outras conquistas.
            Espero sinceramente que este ano ano seja de uma benesse completa, sem sutilezas, que todos se vinguem dentro daquilo que almejam para si. Que minha banda decole, que meu livro se acabe, que meus sites e colunas continuem, que minha filha e esposa continuem belas e jovens e loucas a ponto de me amarem como dizem. Eu as amarei sempre, isso é inquestionável. Meu maior problema vai ser o dia em que eu tiver que dividir a minha filha com outro malandro e escutá-la dizendo Eu te Amo para outro, mas essa é uma abstinência – dela – que ainda terei muito tempo para sentir. Feliz Natal e um Ótimo Ano Novo para vocês.

domingo, 5 de dezembro de 2010

Crônica do Natal Iluminado

Bom, cá estamos nós nos encaminhando para o Ho-ho-ho's Day! Natal, o dia do nascimento de Cristo, uma data especial onde refletimos sobre nossas ações ao longo do ano, fazemos uma auto-análise para ver se fomos suficientemente humanos, lembramos de pessoas queridas que estão longe ou que, infelizmente, não estão mais entre nós. Com tudo isso é impossível não ficar melancólico.
Acho o Natal lindo quando o vejo através da TV. NY é fantástica com todas aquelas luzes e decorações extasiantes, sem contar com a árvore do Rockfeller Center e a vitrine da Macy's, dá vontade de ficar preso na tela para congelar esse "clima"; a Champs Elysèes toda iluminadinha... Aí a gente sai e olha as ruas do Rio de Janeiro e se desanima, pois a própria cidade se encarrega disso! Gente, tirando a árvore de Natal da Lagoa, que é um oferecimento de uma empresa privada, e algumas poucas fachadas de bancos e shopping centers, não há mais nada para ser visto. Ou as pessoas estão ficando "pão duras", ou o espírito natalino foi alvejado por alguma bala perdida, porque não há mais pisca-piscas nas varandas e janelas das casas e apartamentos. Pelo menos no Centro e na Zona Sul. Para não dizerem que estou sendo muito dura, em alguns prédios da Lagoa, da Vieira Souto e de outras áreas nobilíssimas, ainda é possível ver belas decorações, mas o quê aconteceu com as demais residências.
A Prefeitura passa o ano inteiro correndo atrás de camelô, dando choque de ordem nas praias, armando para extorquir um pouco mais a população com uma cretina taxa de iluminação pública e nem ao menos se digna a enfeitar a cidade!!! Tudo bem que não dá pra decorar cada cantinho de cada bairro, mas pelo menos os pontos mais visitados pelos turistas e também pelos cariocas. Imaginem se a Candelária estivesse iluminada por várias microlâmpadas, as árvores da Enseada de Botafogo, o bondinho do Pão de Açúcar ou o Cristo Redentor, a praça N.S. da Paz, o Maracanã com um gigantesco Papai Noel, o canteiro central da Av. Atlântica com luzeszinhas piscantes? Tá ficando mais bonito? Será que nosso edil não poderia estudar um programa de incentivo à decoração das residências?
Moro em um bairro tradicionalíssimo da Zona Sul do Rio e aqui dá até depressão nessa época, parece que você tá passando o Natal num mausoléu; acho até que o S. J. Batista é mais animado! Todos se fecham dentro de seus apartamentos e comemoram egoísticamente com suas famílias e amigos; não se soltam fogos, não se ouve Noite Feliz nem Jingle Bells, só o alarme de algum carro atingido por um bêbado deprimido pela data.
Espero que neste 2010 as coisas sejam diferentes, mais felizes e pelo menos com um pouco mais de paz para nossa população. Que brilhem as luzes artificiais, mas, sobretudo, a luz que existe em cada cidadão carioca.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Sexta às Nove (55)

Sua dose semanal de remédio musical.



Leandro Sapucaí e Marcelo D2.

Quem conhece o Marcelo D2 sabe de sua mistura samba-rap. O que, devo admitir, ficou bom, apesar de eu não arredar o pé em insistir que todo eletrônico diminui a Música, quando não a mata.

Enfim, devido aos acontecimentos recentes no Rio de Janeiro, penso ser oportuno essa canção, a qual não acho necessário dizer mais do que eles mesmo disseram no seguinte trecho:

"é que o Judiciário tá todo comprado e o Legislativo tá financiado" 

R.G

SOU

Ariano
Generoso
Honesto
Positivo (quase sempre)
Sarcástico
Mal guitarrista
80% “anjinho” 20% “diabinho”

TENHO

33
Uma cadela linda
Algum material publicado
Muita coisa para fazer
Pouco tempo
Tesão

NÃO TENHO

Vontade de ir à Meca
Muita saudade do que passou
Uma Ferrari
Paciência com pessoas perversas
Tempo para dormir

ACREDITO

Em Deus
Na capacidade humana de edificar coisas extraordinárias
Na capacidade humana de fazer m …
Que conseguirei fazer
Que posso melhorar

NÃO ACREDITO

Em promessas (principalmente naquelas vindas de Brasília)
Em auto-marketing
No que o Lenon disse
Que o trabalho dignifica o Homem

GOSTO

De lasanha
De escrever
De pensar que sou legal
De música barulhenta
De finais felizes

Não entendeu? Relaxa! Aqui não há nenhum “decifra-me ou devoro-te” … Mas quanto à você?!

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Sexta às Nove (54)

Sua dose semanal de remédio musical.

Titãs, senhoras e senhores [e Calixto].



Uma melodia daquelas que não ouvia a muito tempo. Um empréstimo modal¹ na ponte², como sempre bem fica. Uma letra contadora de história como gosto. E ritmo de preto.

Tinha como ser melhor?

Não.

Deixe o pai de Marvin batucar na sua cabeça essa mensagem de vida.

Aproveite.

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Esclarecimentos:
¹ Empréstimo modal é um fenômeno harmônico onde, numa canção que está num determinado tom pega "emprestado" uma nota do seu tom homônimo. Exemplo da música acima: A música está no tom de si maior (B) mas depois adota o acorde de si menor (Bm) pertencente ao tom de si menor.

² Ponte é o que está entre o refrão e as estrofes.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

O Tédio

Poema declamado pelo grande Dublador Isaac Bardavid.

É reconhecível nos primeiros segundos, mas para título de informação, Isaac é o dublador - dentre outros personagens - do Wolverine.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Sexta às Nove (53)

Sua dose semanal dde remédio musical.



Acho que cometi um crime dos mais imperdoáveis.

Explico: um amigo me recomendou a versão de Elis Regina da canção postada acima.

Então fui ouvir a tal versão... e não gostei.

É, também achei estranho. Gosto muito da Elis Regina, suas interpretações são vicerais e melhoram as músicas.


Por outro lado, sempre preferi as versões dos próprios autores das canções. Sempre achei que o compositor, o útero da obra parida (segundo a doutrina Calixtiana), teria algo a passar daquilo que dele saiu. E por experiência própria sei que cada pessoa que canta uma música, invariavelmente põe algo dela mesma na canção que canta. Mesmo que parece que o cantor nada fez, somente papagaiou a música, isso mostra que ele é oco. É fatal.

E com absoluta certeza Elis não era oca. Aquela baixinha tinha mais conteúdo do que muitos artistas juntos, somados.

Entretanto, entre a interpretação da Elis e dos Demônios da Garoa, preferi a destes. Não achei um vídeo de Adoniran cantando essa música toda, por isso não botei um vídeo dele mesmo cantando. Mas, por motivos estéticos, preferi a versão deles. Um samba, uma vez parido não se transforma em nenhum outro gênero. Não sem se revestir de um incômodo vazio. Mesmo transformar um Samba em Bossa, como fez Elis. Confesso: não aceito facilmente mudanças quando se trata de música.

Mãe é quem cria. E os Demônios da Garoa estão com essa criança há muito tempo.

Aproveite.

sábado, 6 de novembro de 2010

A experiência de escrever um romance

Estive muito a pensar em escrever esse texto. Até porque é de uma certa petulância afirmar-se escrevendo um romance. Romance é coisa para escritores, os verdadeiros, os capazes, os já consagrados. Eu ainda não posso me chamar de escritor, pois não tenho um livro publicado, apenas alguns contos em algumas revistas especializadas e outros que foram levados por amigos que conseguiram publicação. Mas escrever um romance é um pouco da demonstração de minha petulância diante do meu ato de escrita. Não que me vejo como escritor - apesar de este ser o meu mais óbvio sonho - porém estou mesmo na labuta de terminar um. E este é um trabalho árduo, muito pesado, lento e angustiante. Escrever um romance é a mais densa experiência que se há na escrita.
Já escrevi monografias, que julgava ser um exercício árduo, mas nada se compara a este trabalho de romance. Até porque, um texto leva ao outro, que leva ao outro. Hoje eu entendo o motivo pelo qual os entrevistadores sempre perguntam quanto tempo levou o Senhor Escritor para escrever a obra. Em média se fala de um período de três anos, ou quatro, ou menos, ou um pouco mais, no entanto sempre nesse período (não consegui comprovar uma afirmação sobre o período de escrita de Macunaíma, de Mário de Andrade, algo como duas semanas - depois de uma pesquisa de dois anos). Um conto de uma página - padronizada de Word - leva uma ou duas horas. Dependendo do que você quer colocar, pode até levar um dia, mas é simples escrever. Um conto é rápido, sintético, um doce de brincadeira. Alguns poemas também são tão rápidos assim, João Cabral, o engenheiro da poesia, já levou dez anos escrevendo um texto poético. Enquanto que esses dois modelos, por serem menores, podem ser rápidos ou longos, depende do que se espera do texto. Mas romance, meu Deus, é para lá de extensivo. 
O meu caso: já iniciei três romances: um joguei fora, o outro estagnou-se e o terceiro está sendo a literal evolução de um conto. Entende-se por romance a diferença entre singularidade e pluralidade de um texto em prosa. Histórias com um personagem principal, uma situação, um clímax, um ambiente, ou seja, na limitação de singularidades, é um conto. O romance já seria tudo no plural, vários entrecortes, personagens, situações, capítulos, diz-se como algo por romance. Mas isso é algo ainda muito, mas muito árido de se realmente definir. Saramago mesmo dizia que sempre escreveu contos ao invés de romances, mas era definido romancista por uma facilitação de venda de sua obra. Eu apenas julgo estar escrevendo um romance, por ser uma clara evolução rítmica às pluralidades, algo que aprendi com o Escritor - pena só ter o E maiúsculo aqui, assim colocado por uma mera questão estética textual - Antônio Torres. Ele é romancista em sua excelência. E tentar escrever esse romance é ter Antônio sempre aqui ao meu lado, como se por cima de meu ombro, dizendo o que posso e o que não posso. Por isso, a evolução de meu texto é muito lenta. Escrever uma página me custa um dia de observação do programa de digitação, ao mesmo tempo em que tive que reler tudo o que escrevi. O meu primeiro chegou a setenta e poucas páginas e o claro julgamento de que ficou uma bela porcaria. O segundo - resultado de uma ideia que tive quando tomava banho - está estagnado, julgo ter perdido o fio da meada. O terceiro, resultado de um conto para um livro coletivo, não se prendeu ao fim do ponto e resolveu seguir seu caminho. É o primeiro romance em que a obra está totalmente viva, única, alheia às minhas vontades. Enquanto que os outros eu muito pensava para colocar uma palavra ou vírgula, nesse último o livro apenas me usa como digitador. Eu sou um útero, a obra me escolheu como fonte para o próprio parto. 
Não me lembro bem de quem um dia me afirmou que toda obra escolhe a pessoa por quem ela quer vir. A ideia é na verdade algo metafísico, a escolher por que fonte humana ela quer nascer. Nós, em nossa megalomania, achamos que fomos nós que a escrevemos. Todo o trabalho que temos em muito escrever durante a adolescência e o início da fase adulta, domando o pensamento e a mão atrás da melhor frase, é um falso julgamento próprio, é no fundo a ideia que vai nos dirigindo para chegar o momento certo para poder parir-se. Perceba o pronome, parir-se. Por isso, posso afirmar agora que a obra, que há naquele romance, me escolheu para parir-se depois de tanto tempo me imaginando capaz de poder escrever algo. Até posso dizer que escrevo algo. Mas será que agora é um romance mesmo?
Termino na pergunta, em função da sensação de estar próximo da possibilidade de certeza. Gostaria muito de ter a sensação de certeza, de me laurear escritor - para mim, só é escritor verdadeiro aquele que consegue publicar algo digno -, mas vejo que eu não detenho a fina chance de poder dizer a mim mesmo tal e que somente forças maiores e subjacentes é que, talvez, um dia me deem a chance por tal. Espero ansiosamente, como uma criança na espera do presente de natal. E se esse dia chegar, juro nunca mais largar o brinquedo, pois a muito tempo que estou na brincadeira. E ela é gostosa. Imagina, então, quando tiver o danado nas mãos? Esquecerei até de comer. Algo que os meus mais próximos amigos sabem que sou um senhor praticante. Na arte de comer já tenho a consagração. Só me falta agora uma outra, que espero ansiosamente, mais do que nunca. 

domingo, 31 de outubro de 2010

VIDA. OU O QUE QUER QUE SEJA

Vagarosamente encaro
Um dia a mais
Sinceramente espero
Um dia mais
Quente... ou frio

Em meus medos aquecido
Friamente busco um sentido
Porém A-Luci-Nada-Mente
À mente que despreparada sente
Desesperadamente
Hipotermias de morte
E transpirações de vida... e morte
Ao dizer que nem tudo é questão de sorte

Independentemente 
Do que realmente seja
Tudo depende do modo que a vemos
Peso pêsames e sofrimentos
Apesares superações e alegrias

Antes que a inesperada
Indesejada e amaldiçoada chegue
Eu me permito permitir
Chorar pular cantar rir brincar amar
Apesar de tudo

Supero meu mundo todo
De mim ou do que me cerca
Das tristezas que sendo fartas
Esvaziam-se por gestos raros
E provas de amor inatas

E não desisto por nada
Pois certeza versus esperança
Em corpo meramente mortal
Só saberemos que acabou
Quando chegar o ponto final.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Feliz Dias dos Professores

Eu joguei pólvora na linha que a Cruz de Cristo deixou no chão
Nela eu minei o rastro com toda veemência
Não espantei os abutres que se alimentavam do sangue que pingava
Nem espantei os falcões que atacaram os abutres

Dinamitei as ruas que se formaram do ratro de sua dor
Assoei o nariz no santo sudário
Coloquei no meu rabo o escapulário
E vomitei pra não aproximarem do seu túmulo

Hoje sinto o toque do enxofre
A cicatriz das asas cortadas
No meu reino crio almas penadas
E escuto o síbilo sutil das dores alheias

Pois então acordei
E vi que o enxofre era apenas pó de giz
Os gritos eram de crianças
ensandecidas
Na minha frente havia uma pauta de notas
Me acordei professor no reino dos iludidos!

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Hexacampeão

Tarde de quarta-feira, céu azul, sol escaldante das duas da tarde e... estávamos trabalhando. Eu e um grupo de amigos tínhamos que apresentar os resultados das nossas pesquisas em um local público, de fácil acesso a qualquer cidadão. Não era uma tarefa difícil, mas, à medida que montávamos a exposição, o calor nos incomodava mais.
Assim que conseguimos um tempo para conversar, chegamos à conclusão que todos precisavam de uma cerveja gelada para acalmar os ânimos – não que fôssemos alcoólatras, mas éramos estudantes. Procuramos a padaria mais próxima e discutimos um pouco, até decidir qual marca comprar. Assim que chegamos a uma conclusão – mais individual do que coletiva, visto que cada um escolheu uma cerveja de marca diferente – seguimos para o caixa.
Paguei minha cerveja e encontrei um amigo, conversei um pouco com ele enquanto os outros pagavam a cerveja. Logo uma amiga se juntou a nós e ficou analisando sua latinha. Vimos que ela estava toda desenhada com os logotipos da Copa Mundial de Futebol que tinha ocorrido meses antes, e pensamos que a cerveja poderia estar fora da validade. Depois de analisarmos um pouco a situação, resolvemos que ela poderia tomá-la assim mesmo. Ela concordou e abriu o lacre.
“HEXACAMPEÃÃÃÃÃÃÃO!”
Com o susto, cada um de nós se afastou o máximo que conseguiu da latinha escandalosa. Ela foi parar no chão depois de ser aberta e começar a gritar desesperadamente – sim, a latinha! Todas as pessoas que passavam por aquele local tomaram um susto tão grande quanto o nosso, inclusive as balconistas da padaria e os clientes mais próximos. Depois do susto, começamos a rir ao perceber que se tratava de uma latinha premiada da promoção ocorrida durante a transmissão dos jogos da Copa. Foram criadas latas especiais que soltavam o “grito da torcida brasileira” quando abertas, com o objetivo de estimular a torcida durante os jogos da seleção – e o consumo, é claro.
Depois dessa história toda, o que mais nos deixou revoltados além do fato de a Copa já ter acabado, da seleção brasileira de futebol não ter sido campeã e da latinha ter começado a fazer um escândalo no meio da rua, foi o fato de termos que voltar para o trabalho sem beber a cerveja.

domingo, 10 de outubro de 2010

Vagalume - PASIÓN - Sarah Brightman

Amar é renascer todos os dias.

Bem, esse é um texto dedicado a todos aqueles que precisam de um "empurrãozinho" para sair da inércia emocional. Sei que muitos vão questionar: "Como ela pode escrever sobre isso se está sempre se queixando da sua vida amorosa?", e eu respondo, de antemão, que se eu me lamento das minhas desventuras emocionais em série é porque estou viva, é porque eu não desisto de tentar acertar, é porque eu não me encolho num canto por medo de sofrer. "Quebrar a cara" faz parte do doloroso e longo processo de crescimento.
Eu, e muitos leitores, já passamos por algumas separações na vida: separações de amigos que vão para outros lugares e tomam outros rumos, separações de entes queridos cuja missão nesta terra já foi cumprida, separações de amores que cansaram de nós e nós deles. Dos amigos sentimos saudades, mas sabemos que eles estão a um clique de distância; dos que já se foram sentimos a dor da perda irreversível, mas dizemos que a vida tem que continuar. Então por que na separação de um amor algumas pessoas querem se enterrar no medo? Por que alguns se refugiam na própria insegurança ou no sofrimento? O que eu vejo é muita gente procurando desculpas para fugir da liberdade, porque já estão tão acostumados ao "cativeiro", que lhes falta coragem para tomar a vida nas mãos, pois isso acarreta escolhas, escolhas pessoais e intransferíveis que não poderão ser creditadas na conta do outro se forem as erradas. Por mais traumática que tenha sido a experiência anterior, muitos acham que é pior ser livre no deserto do que escravo no Egito (Êxodo 16:3), ou seja, é melhor ficar lambendo as feridas e vivendo do passado do que abrir o coração e buscar um novo amor. E olha que alguns sortudos nem precisam procurar, o novo amor, literalmente, toca seu interfone, mas esses Mr. Magoos fazem cara de paisagem e, muitas vezes, perdem o bilhete premiado!
Olha só, gente, a vida está passando! De nada vai adiantar ficar se lamentando, dizendo que o ex fez isso e aquilo... A melhor resposta que se pode dar é viver, partir para outra e ser feliz, escandalosamente feliz. Sem essa de que não está preparado para um novo relacionamento porque essa desculpa não cola! Ninguém está preparado para o novo, para o desconhecido; no entanto, nós o vivenciamos todos os dias, a cada minuto. Assustador? Sim, mas já pensaram em quantas situações felizes podem estar contidas nesse "novo" relacionamento? Basta acreditar que amar vale a pena.
Caro leitor, o Ministério da Saúde garante: "Amar é benéfico à saúde". Amar faz bem ao coração e à alma, revigora, fortalece o espírito e dá motivação para enfrentar o dia-a-dia (já percebeu que quando se está apaixonado os problemas são mais fáceis de resolver?), rejuvenesce, faz bem à pele, ao cabelo e aos olhos; o ato amoroso relaxa, emagrece e traz bem-estar mental. Como é bom beijar, abraçar, andar de mãos dadas, deitar no colo, sentir as mãos da pessoa amada acariciando seu corpo... Por que deixar para amanhã a felicidade que se pode ter hoje? Não estou tratando de prazer imediato, barato, desses que se compram em qualquer esquina; não, estou falando do prazer carpe diem, da felicidade de viver o amor agora e não depois, pois pode não haver depois, pode não haver tempo! Não estou agourando ninguém, nem sendo fatalista, mas quero que vocês lembrem que a vida é curta demais pra desperdiçar tempo preocupados com incertezas, medos, inseguranças e traumas. Tenham sempre em mente que o amor, quando genuíno como o de irmãos, de pais e filhos, nunca pode ser roubado ou destruído, estes sobrevivem ao tempo e às intrigas; porém o amor Eros, esse, pode morrer por inanição e descuido.
Então, a todos os que estão na dúvida se devem ou não se entregar a um novo amor, a uma paixão, vai aqui a minha sugestão: liberem seus corações, atirem o passado no abismo, amem muuuuuito e se deem o direito de ser felizes, parem de se boicotar e de boicotar quem quer amar vocês. É hora de renascer!

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Modernidade

- Alô...
- Oi querida, que bom ouvir sua voz!
- Querida é o cacete...a única coisa que não sou para você é querida!
- Como assim, tá maluca?!
- Quer saber, naquele nosso primeiro encontro eu te achei o máximo, depois comecei a perceber que você é bem menos interessante quando estou sóbria... até pensei que você tivesse mau-hálito, por isso sugeri que comprássemos chiclete, mas nisso tenho que fazer justiça: eu estava enganada...
- O quê?
- Não terminei... você definitivamente não tem os olhos do Brad Pitt nem tampouco o perfil do Rodrigo Santoro...até que você é bonitinho e não é um cara burro, mas essa mania de ser sempre metido a engraçadinho por vezes enche o saco...nem tudo que você fala aparentando um tremendo sarcasmo refinado é tão sofisticado assim e tenho certeza que não leu todos os livros que vive dizendo que leu...
- O que é isso?! Resolveu fechar pra balanço e ter um ataque bomba de sinceridade?! Não estou entendendo nada e não me lembro de ter pedido para ser tão franca assim e dizer exatamente o que você pensa de mim!
- E tem mais...até que nosso beijo combina, temos uma certa química, mas você também não é tão bom de cama quanto pensa ser, as vezes é rapidinho demais...
- O quê?
- Mas quer saber, o pior de tudo é ser um canalha mentiroso, poderíamos até dar certo e achava que estava quase apaixonadinha por você....mas deve lembrar que havia mencionado que não tolero mentira e você ainda ironizou dizendo que essa é uma das frases mais típicas do universo feminino...mas que essa mulherzinha aqui leva cem por cento a sério!
- Tem certeza que não está interessada primeiro em respirar pelo menos antes de continuar me detonando e segundo me explicar exatamente o que está acontecendo?!
- O que está acontecendo?! Acessei seu ORKUT e no perfil dizia que você tinha namorada! Quatro meses me enganando! Não teve a decência de me deixar escolher se queria ou não isso para mim!
- A é isso?! Até ontem, se tivesse xeretado meu ORKUT antes, estaria escrito solteiro. De noite, pensando em nós resolvi mudar a droga do meu perfil para namorando...você, no caso, sua tonta! Queria te fazer uma surpresa, mas não imaginava que na sua visão eu era praticamente um micróbio ou um estrupício com tantos defeitos...
- Que fofo! Então somos namorados de verdade? Você é uma gracinha...eu juro que sempre achei que de perfil você é a cara do Rodrigo, só que com os olhinhos do Brad Pitt e mais, naquela noite...

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

DIAS

Todos os meus dias iguais são diferentes. Mania insana de “gente Poliana”: teimar em ver o lirismo que não existe no dia-a-dia ... Ou será que existe?

domingo, 19 de setembro de 2010

Concurso para políticos (Desçam ao Inferno!)

Prova atrás de prova, horas sentada em uma cadeira desconfortável, sendo vigiada como uma presidiária, queimando todos os meus neurônios, depois de passar dias estudando como uma louca, pra quê?? Para tentar uma reles vaga no serviço público, em um cargo que nem demanda tanta responsabilidade assim. Então em meio ao desespero básico que bate depois da quinquagésima questão, a minha mente começa a divagar, seja em que concurso for; o último foi o do MPU, em meio à perguntas sobre Direito Constitucional, Administrativo, legislação disso e daquilo e mapeamento de competências, fiquei pensando por quê eu tenho que passar por essa Via Crucis, enquanto dezenas de cretinos no horário político infernal gratuito sequer têm o Ensino Médio!
Ah, gente, isso me revolta!!! Por que eu tenho que ser o Einstein para concorrer a uma vaga de Analista Administrativo? Se pra ser político não precisa de um décimo desse conhecimento... Tem cada figura absurda, saída de filme de terror. Socooooorroooo! Se eu tenho que prestar concurso para ser funcionária pública e servir ao meu país, quanto mais os membros do Legislativo e do Executivo! Esses deveriam prestar o Enem, o Vestibular, o Concurso Público e passarem por várias sabatinas antes mesmo de cogitar uma candidatura! Um político deve estar apto, conhecer a Constituição de fio a pavio, fazer curso preparatório para quando se sentar em uma daquelas cadeiras do Congresso, da Assembléia Legislativa, da Câmara e dos Palácios, não fazer como uns e outros e ser mais um sanguessuga inútil. Não quero um "zé ruela" me governando e ditando as regras do meu país e da minha vida.
Não vou ser tão injusta a ponto de colocar todo mundo dentro do mesmo balaio, sei que existem políticos honestos, capazes, inteligentes e Graças a Deus por eles, mas pelo que eu vejo no Otário Eleitoral Gratuito e pelo que eu já vi nesses bons anos de vida... ai, que tristeza! Estamos descendo a ladeira e sem freio de mão!
Estou azeda mesmo, pois no próximo sábado tenho mais um suplício me esperando, enquanto nossos maravilhosos candidatos vão se divertir às nossas custas, fingindo que gostam do povo pelas ruas, sorrindo, abraçando, beijando e prometendo mundos e fundos aos mais crédulos, pois nisso eles são Ph.D.. Ih, será que eles sabem o que é Philosophiae Doctor?

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Sexta às nove (52)

Sua dose semanal de remédio musical.



Não sou Calvinista, mas existem coisas que são boas demais para terem sido obra do acaso.

Tom e Vinícius são o tipo de coisa que não seriam se não fossem os dois.

Vinícius eu conheci por meio do mentor desse Sarau virtual. Naquela sala branca e azul com cadeiras sobre-postas, Calixto me fez atentar e apaixonar pelo poetinha. Dele vim a conhecer o Tom Jobim. Pronto, estavam decretados meus dois inafastáveis mentores musicais. Foi mais forte do que eu.

E essa música em particular me atacou numa meio de dia abafado, desses iguaçuanos.

"Mas o amor sabe um segredo
o medo pode matar teu coração"

Não preciso falar mais nada, Camará. Os olhos desse Rimbaud às avessas diz tudo.

É água de beber.

Aproveite.

sábado, 11 de setembro de 2010

Sexta às nove (51) - atrasado

Sua dose semanal de remédio musical.



Caetano.

Caso vocês não lembrem, faz um tempo que disse aqui que "não devo levar Caetano a sério". Bom, talvez ele não me seja tão afeto como pessoa, mas preciso sucumbir a sua capacidade musical. Primeiro por vê-lo no documentário "uma noite em 67" (indico) literalmente vergando a platéia diametralmente, fazendo-os mudar das vaias para a ovação completa e unânime. Segundo por essa música. Cajuína.

Começando com uma pergunta clichê, ele vai tecendo sua melodia de um jeito a fazer você entender não entendendo o que ele disse. Como se as palavras não fizessem sentido se ditas puramente, mas com a melodia fizessem um pouco de sentido.

Isso se chama música da boa!

E caso vc queira saber da história dessa música, clique aqui, vale a pena.

Aproveite.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Cala a boca que eu quero dormir!


É impressionante como tem gente que realmente não consegue se limitar ao próprio espaço, e por questões que eu nunca saberei explicar e muito menos entender, precisa da atenção de qualquer um, a qualquer custo. O caso mais famoso de carência explícita é a viagem de ônibus. E isso tende a piorar quando o seu destino – e, por azar, o do infeliz sentado ao seu lado – é outro estado, que parece estar localizado em outra galáxia.
É um tempo que naturalmente já demora a passar, mesmo com a persistência de um olhar suplicante ao relógio, que insiste em retroceder a cada espiada. Você pensa que o pior não é estar ali, com um inconveniente ao seu lado, e tenta manter sua cabeça em qualquer lugar do mundo, ou até fora dele – desde que seja bem longe daquele ser estranho. Mas, depois de minutos que parecem uma eternidade, percebe que por maior que seja a sua tentativa, ela é inútil, pois os “ahans” ditos por mera questão de educação parecem roubar toda a sua concentração.
Tudo o que você queria, quando achou a sua poltrona, se acomodou lá e colocou os fones de ouvido era realmente ouvir suas músicas em paz, ler umas duas ou três placas indicando cidades diferentes e, depois, cair no sono. Foi tudo o que eu não fiz.
– Licença... Você vai fazer alguma prova? – já revirei os olhos e rezei para que ele não tivesse muita criatividade para uma conversa com estranhos.
Tive que tirar um dos fones e diminuir o volume. Respondi o necessário, mas não pude deixar de perguntar sobre qual prova o indivíduo estava falando. Ao contrário de mim, ele começou seu longo discurso, que por meio de algumas conjunções foi conectando a outros, outros e outros.
Desliguei o mp4 e guardei na mochila, afinal, não conseguiria mesmo ouvi-lo. Mas me arrependi subitamente, pois foi aí que ele realmente começou a construir seu monólogo. Vi-me sem saída e mesmo que por educação, entrei no assunto.
– Prova? Não. Nem sei de prova nenhuma. Você vai fazer? – já sabia que tinha feito uma pergunta idiota, mas não consegui pensar em nada com mais de três palavras para dizer.
– Não. Eu estudo em Barbacena e blábláblá.
A partir daí, eu não prestei atenção em uma palavra que foi dita. Ele era até bonitinho, e eu poderia até pensar em conversar com ele por interesse, mas eu realmente estava sem paciência, cansada, com sono, fome e TPM.
Sem contar que com dez minutos de uma conversa em que eu não lembro nem uma frase, ele me pede para lembrá-lo meia noite e meia, para ligar para a namorada. Então, meu único motivo sólido para deixá-lo falar foi por água abaixo. E foi quando eu percebi que já eram quinze pra uma da manhã e ele persistia na tentativa de construção de uma conversa.
Nessa hora eu pensei melhor e me arrependi de não tê-lo feito antes. Era tão simples fugir, bastava virar pro lado, e por menos que eu conseguisse dormir, era fácil fingir. Pelo menos pra mim, era! Foi o que eu fiz. Numa tentativa frustrante de me desvencilhar de um garoto carente e sem sono sentado ao meu lado. Mas ou ele fingiu não perceber, ou de fato não percebeu. Enfim... Continuou falando, falando e falando.
Talvez eu já possa escrever um livro sobre ele, tipo uma biografia. Um garoto de uns vinte e poucos anos, como diria a minha avó, “até bem apessoado” e com uma namorada muito ciumenta. Mora em Campo Grande – meus pêsames – mas estuda em Barbacena. Apesar de ser bem modesto, estuda na Escola da Aeronáutica, pois sempre sonhou em ser piloto, e ama fazer isso. A namorada mora no Rio e, por isso, volta todo final de semana para visitá-la. E apesar de ter alcançado seu sonho de criança, se arrepende de ter ido pra tão longe de casa, e tem uma pequena pretensão de voltar para seu estado, mesmo que seja para cursar o ensino superior na Marinha, já que a vida de piloto é muito nômade – palavras dele.
Um breve resumo das poucas coisas que consegui captar, mesmo não expressando opinião alguma sobre tal. E depois de umas duas horas me contando sobre sua longa vida, finalmente resolveu ir ao banheiro. Aproveitei essa hora para realmente dormir, já que tive um dia cheio e muito cansativo, assim, ele chegaria e eu estaria de fato dormindo.
Com a graça de Deus, consegui dormir e, pelo jeito, ele também. A cada solavanco mais agressivo do ônibus me batia uma fobia absurda de que ele me visse acordando e resolvesse abrir aquela matraca novamente. A minha sorte é que sou uma exímia atriz, e manipulei a situação para que ele não percebesse nada.
Ele desceu duas cidades antes de mim, e finalmente consegui terminar a viagem em paz. O que me deixou realmente frustrada foi chegar ao meu destino e passar por essa situação outra vez. Só que agora, era alguém que eu podia simplesmente falar um “cala a boca que eu quero dormir” daqueles bem sonoros. Era a minha irmã quem não parava de falar!

Por Bárbara e Paula Zdanowsky

domingo, 5 de setembro de 2010

O HOSPITAL

“Droga! O plantão parece sem fim hoje.”, Marcus pensou enquanto caminhava pelo longo corredor do hospital. Sentia dores por todo o corpo. Por que tinha aceitado esse cargo? Não precisava dele nem pelo salário, nem pelo status. Aliás, que status há em ser assistente do médico legista? A única coisa de que tinha certeza era que estava trabalhando demais e ficando cada dia mais parecido com os “hóspedes” do morgue: sem cor e sem vida!
Desde a morte de Zac, seu melhor amigo e colega, sentia uma necessidade imbecil de mergulhar no trabalho. Só assim não sobrava tempo para pensar nas circunstâncias do acidente que matou Zac. No entanto, sempre que tinha uma brecha, um tempo ocioso, as lembranças tomavam conta da sua mente. Recordava o início da amizade entre eles na faculdade de Medicina, o jeito “excêntrico” do amigo – aliás, não sabia, até hoje, se essa excentricidade estava mais para mentira ou fantasia –, relembrava as festas, os amores, tantas coisas... E agora tudo estava virando pó. Sentia-se culpado. Talvez, se tivesse levado à sério os relatos do amigo...mas não! Creditou tudo à compulsão por mentir e à imaginação fantasiosa de Zac. “Ah, Sr. Zacarias, será que dessa vez você tinha razão? Bobagem!”.
Nas últimas semanas que antecederam sua morte, Zac disse que andava ouvindo vozes, que se sentia observado e perseguido quando passava pelo mesmo corredor que ele, Marcus, caminhava agora, durante os plantões noturnos. Zac andava nervoso, desatento, chegou a trocar as identificações de dois cadáveres, um verdadeiro desastre.
Sem perceber tinha parado em frente ao elevador do 6º andar, local do fatídico acidente, lançando um olhar vago para o fundo do poço escuro, distante. Por um instante teve a impressão de ver, através da porta pantográfica, o corpo inerte do amigo. “Pare com isso Marcus ou você vai acabar como o Zac!”, disse para si mesmo e foi buscar o material que o legista-chefe, Dr. Benjamin, havia lhe pedido há mais de 15 minutos.
Assim que cumpriu sua tarefa, voltou ao corredor deserto decidido a tirar uma soneca antes do lanche da madrugada. Ficou contemplando o pé-direito altíssimo, característico das antigas construções. Aquele edifício datava do século XIX e tinha o odor dessa época, parecia que estava impregnado nas paredes. À noite, a iluminação fraca projetava sombras sinistras e o silêncio dos últimos andares era quebrado pelos gemidos de dor dos pacientes do quarto andar, ruídos fantasmagóricos... Talvez esses sons tivessem contribuído para afligir ainda mais o espírito perturbado do seu falecido amigo.
Adormeceu e teve um sono agitado. Sonhou como há muito não fazia ou não lembrava que fazia. No sonho andava pelos corredores escuros do hospital, empurrando o corpo de um jovem que havia sofrido um acidente durante uma escalada. Ele tinha a cabeça fraturada, uma fratura tão grande que era possível ver a massa encefálica, além de estar com a clavícula exposta e o corpo todo escoriado. Os ferimentos eram feios e, apesar da limpeza superficial que os enfermeiros haviam feito, o corpo tinha muito sangue ressecado cobrindo a pele.
De repente, o cadáver sentou-se na maca e começou a falar com uma voz rouca que parecia vir das profundezas da Terra, mas que, contudo, lhe parecia familiar. Ele, Marcus, empurrava a maca como que hipnotizado, seguindo o comando daquela voz que trazia as lembranças da faculdade, despejando ressentimentos, mágoas, invejas. Era a voz de Zac!
Pararam à beira do elevador. O morto levantou-se, contornou a maca, abriu a porta pantográfica e do poço várias vozes clamaram. Marcus sentiu apenas o toque gélido e suave de uma mão nas suas costas. Fechou os olhos e mergulhou.
Despertou assustado sentindo seu corpo extremamente solto e a lufada de vento no seu rosto. Esfregou os olhos, achando que estava sonhando dentro do sonho, mas quando conseguiu abrí-los só teve tempo de enxergar a escuridão final.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Sexta às nove (50)

Sua dose semanal (?) de remédio musical.

Bilbo Bolseiro, conversando com seu amigo Gandalf disse certa vez que cinquenta era um número um tanto sinistro talvez porque ele comemorou seu quinquagésimo aniversário saindo numa aventura com um bando de anões em busca de um tesouro guardado por um velho dragão.

Mas, aventuras fantásticas de lado, realmente o Sexta às nove número 50 também relutou a aparecer, talvez por medo, ou por coincidência.

E para uma acontecimento singelo e marcante, uma música de igual quinhão. Uma que tem sido frequentadora fiel de meus pensamentos e seus acordes nas minhas mãos ao violão e sua melodia em minha garganta.

Aqui, Cartola nos ensina sobre a vida como poucos. Numa simples canção, ele manda um grave alerta a qualquer um que não tenha o costume de repensar por onde "cai um pouco a tua vida"

Ouçam-no bem. O mundo é um moinho.

Cinema, letras e pessoalidades I: Viagem à Lua (1902) – dá para ver no YouTube!!


Impressionante a obsessão de nós seres humanos pelo obscuro, o desconhecido. Neste filme que, salvo engano, é o primeiro do gênero ficção científica – claro algo foi feito antes do Spielberg e do Lucas – feito apenas sete anos depois da invenção dos irmãos Lumiére e quatro anos depois do voo real de Santos Dumont. Assim, salta aos olhos a sedução e a longevidade do tema da viagem ao espaço e da colonização da Lua. Detalhe: o roteiro fora escrito pelo obsedado J. Verne!

Certeza e crença na capacidade humana não faltava à época: ferrovias, telefone, os “micróbios” e vacinas de Pasteur e Koch, a dominação – à ferro e à fogo – da África e da Ásia com o imperialismo, deveria garantir aos europeus muta segurança e fé na ciência

Nesse contexto é que se desenrola a trama de curtos oito minutos da ainda engatinhando sétima arte. Chama atenção a frequente e irritante “trilha sonora” tocada, ao que parece, ao vivo por um piano ao lado da tela de projeção e a ausência de um roteiro independente das cenas, que na medida exata em que ocorriam eram simultânea e pateticamente narradas, até nos detalhes mais banais como um personagem que caía num balde de água ao construir o “foguete espacial”. Nem essa algo ridícula cena pastelão “autoexplicativa” deixaria de ser literalmente verbalizada pelo narrador!

Quanto os sofisticados e destemidos “homens de ciência” aterrizaram na Lua, vemos alguns elementos que se tornaram quase arquetípicos nesse tipo de película: uma topografia diferente e fantástica (cogumelo gigantes, montanhas...); vidas extraterrestres – que possuíam formas e tamanhos mais ou menos como os nossos (como os “marcianos” dos filmes mais atuais); a guerra dos mundos (ops! O Spielberg de novo) travada … com vitória dos humanos, naturalmente...

Mesmo que o Armstrong décadas depois do filme e num novo contexto de disputa hegemônica – agora na conta da Guerra-Fria – tenha desbravado e desmistificado a Lua, esse clássico do cinema que nos causa tantos estranhamentos do ponto de vista de sua estética e linguagem, ainda nos diz muito sobre os anseios de conquista das “nações civilizadas”, seja contra “marcianos” ou “lunáticos”; “amarelos” e “negros”; “comunistas” e “terroristas”, ou qualquer outro inimigo inventado ou real.

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Tudo é muita vaidade.

Eu sei que ainda não postei o Sexta às Nove e não escapo da dívida, mas explico a demora dizendo que numa mente super-lotada de coisas fúteis, a passageira nunca apressada chamada criatividade não pode entrar. Mas acabo de escrever no meu blog algo que acho que é uma crônica, rs. E passo a replicá-la aqui. Abraços.

***



Sim, faz muito tempo. E já tinha dúvidas em voltar a escrever aqui.

Porém o que me tirou da inércia não foi nada de boa índole. Pelo menos não a primeira vista.

Sinto que escrever esta noite foi questão de vida ou morte. Cada dia mais se agrava esses sentimentos dentro de mim por motivos que ainda desconheço pois nem se quer consigo discernir o que está aqui dentro.

Faz pouco mais de um ano e meio que entrei para a faculdade de Direito. E menos tempo faz que comecei a entender antigos e contemporâneos sábios quando dizem que este nosso mundo está impregnado de vaidades. Não posso comparar-me a eles em quantidade de conhecimento, muito menos em experiência, entretanto não me privo de me identificar com os mesmos.

Quem está próximo de mim já me ouviu tagarelando pelo menos mais de uma vez sobre minhas "crises" [nomeadas assim por eles] com o Direito, que - agora percebo -  não passam de decepções.

Não, não tive prática jurídica de nenhum tipo para ter aquela confrontação entre a teoria aprendida na faculdade e a realidade cruel, você argumentaria. E eu replico perguntando: e preciso disso para me decepcionar?

Basta estar um pouco inserido nos acontecimentos, na realidade para perceber que o paradoxo, além de grande, complexo, organizado, é bancado por quem detém o poder. Não sejamos inocentes, eles detêm o poder sim. Não há colaboração popular, nosso "poder" está limitado a escolher quem vai mandar em nós. E mesmo que chegemos ao poder, seremos nós com ele e uma maioria sem ele, nos obedecendo.

Mas qual o motivo da minha decepção, do mal-estar que me toma o estômago, das noites de sono difícil e das manhãs em que abrir os olhos era o único esforço que eu gostaria de ter, mas que ao mesmo tempo tive a avassaladora vontade de me ver livre de tudo isso que está a minha volta?

Hoje acredito que uma fagulha de entendimento me veio. Acredito ser um sentimento igual ao de Salomão quando este resolveu escrever sobre a vida, suas observações e avaliações sobre o que observava. E a estas anotações os brasileiros chamaram "O Livro de Eclesiastes", para quem interesse saber.

Porém hoje, creio, a situação está potencializada. As contradições, a futilidade, e acima de tudo a vaidade, tomaram proporções insuportáveis. Insuportáveis. por isso no título, parafraseando a célebre frase do Sábio (vaidade das vaidades, tudo é vaidade), resolvi acentuar a mesma com "tudo é muita vaidade".

Sou só eu, ou você também percebe que todas as contradições estão aí, todos já sabem delas, mas ninguém continua a fazer nada? E acredito que realmente não o podem. Essa parece ser uma vil regra: quem tem um poder-fazer na mão, geralmente não o usa, maquia tudo ou com fazeres não "fazedores" (leia-se política em geral) ou com belos, complicados e enfadonhos sistemas de raciocínio, livros, livros livros e mais livros (leia-se eruditos, doutos em geral) e quem chega a uma condição de poder-fazer, geralmente só lá está por submissão a regra de quem lá já está, e está porque está, de não-fazer. Criam-se leis, teorias são formuladas, tratados assinados, "mentes são abertas", revoluções são instauradas, coisas muito importantes são tão heroicamente feitas... E NADA!

Como Arnaldo Jabor uma vez disse, essa é uma época terrível, nos anos da ditadura militar, por exemplo, lutava-se para que a verdade fosse veiculada, os corruptos denunciados, esquemas deflagrados, etc. ... hoje, isso acontece, e ainda assim, nada continua sendo feito! Antes o problema era que a verdade não era conhecida, hoje, ela foi conhecida [eu sei que não toda, é claro que não toda... cala a boca!] e não adiantou nada! [até porque, o que temos basta.]

Aí me deparo, hoje, cursando um curso superior que é a queridinha de toda a erudição mundial: o direito. Convivendo diariamente com pessoas que [em maior ou menor grau] estão impregnadas, embebidas, enfeitiçadas por vaidade. Não me refiro a vaidade no sentido que geralmente ouvimos, de beleza, embelezamento, mas de vaidade existencial, de futilidade de pensamento, de essência oca. E não se assuste com palavras fortes. São palavras. São pessoas que escrevem um livro, gastam horas e neurônios, perdem noites e mais noites de sono e sexo em prol de produzir um manual que explicará uma gama de instruções para que outros façam o trabalho que eles já faziam, só que agora podendo pensar em mudar um detalhe de seu procedimento de trabalho burocrático do dia-a-dia. Coisas como parar de chamar Executivo, Legislativo e Judiciário de "poderes" do Estado para chamar de "funções" do Estado. Ou acrescentar ou suprimir um princípio ao Direito Administrativo. Ou até acrescentar um direito à Constituição, e nesse ponto, só pra esclarecer quem pense que isso é algo importante, ninguém que tenha o "poder-fazer" fará ou deixará de fazer algo por este algo estar na Constituição. E também não é totalmente importante pensar em meios para assegurar garantias à Constituição, pois no final, só respeita uma lei quem tem consciência de que aquela lei deve ser cumprida. E isso, lei alguma criará [a consciência]. 

E a vaidade toda disso tudo que falei consiste no fato de que essas pessoas realmente acreditam e proclamam que estão contribuindo para a melhora da sociedade global. E além disso, se portam e exigem um tratamento como se realmente isso estivessem fazendo. E pior ainda: (quase) todo mundo acredita!

E esse é o ciclo de coisas fúteis, que chamam de mundo, onde eu vivo. E vou vivendo. Aqui, onde as coisas não vão mudar e ainda vão piorar. Onde quem tem um poder de influência maior, e quem influencia influenciadores, os eruditos, os "chefões" não produzem nada, nada além de morte. Morte. Anti-vida. É o que sinto ouvindo tanta vaidade: morte. Mal-estar.

Bem, não sei como terminar. Não tenho saída pra isso, nem pra mim. Porque para isso não há salvação. Ou há a renúncia de toda essa futilidade, de toda esta merda, ou o prosseguir morrendo.

E nele estava a vida, e a vida é a luz dos homens, e nós o rejeitamos. Parafraseando João 1.4-12

domingo, 29 de agosto de 2010

Defina: saudade

Saudade. Palavra forte que toca o coração das pessoas e faz com que, muitas vezes, elas percam a razão. Fazer loucuras, falar besteiras, ligar para alguém na hora errada... É o que acontece quando se sente saudade. Não há como explicar o que nos leva a ser insanos, a chorar descontroladamente por horas ou qualquer coisa do gênero. Mas a saudade não pode ser bem definida por uma palavra, uma frase ou um texto. A única definição que consigo pensar para saudade é dada por ações.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

A irrefreável vontade de ser romântico.

            Disse-me uma vez uma namorada: você se tornou um ogro, o que aconteceu? E não soube responder. Tive que concordar que após certo tempo do relacionamento, eu estava relaxado, pouco pensativo, marital. Não estava mesmo dando aquela atenção a mais, com um sorriso, um carinho no rosto ou na perna, um tapinha ali atrás. Por mais machista que isso seja, esses tapinhas levam a um natural sorriso delas. E eu tinha aberto mão dos tapinhas – estranho ao se abrir mão e não dar o tapa – e depois de não mais do que um tempo desses em que percebemos a perda de algo, ela reclamou a falta de romantismo de minha parte.
            Sempre me fiz assim, um príncipe romântico – mesmo que minha barriga as diga o inverso – e fui de palavras doces, delicadezas auditivas e um pouco de leveza ao chegar até elas. Algo que Mestre Vinícius ensinou. E depois do fato consumado, relacionamento firme, um dedo de mês ou outro, como um desencanto, eu naturalmente perdia esse romantismo e passava a ser apenas mais um homem qualquer que se estabiliza num relacionamento e que se deixar, se apresenta casado assim mesmo, sem mais nem menos, puro cotidiano. Depois vi que isso não era só meu, quase todos somos românticos, bobos, ingênuos, firmeza humana de relacionamento puro, quase uma obra do século XIX, mas depois da noite, da cama, da antipureza, do Naturalismo redentor da carne, voltamos ao extrato do século XX, que deixa linear o que fora turbulento.
            Outra namorada até me perguntou, o que houve com as mensagens que você sempre me mandava?, e uma vez mais a irresposta. Tinha até me esquecido que mandava mensagens. Eram boas. Não vou negar. Tanto que ela, evangélica, deixou o evangelismo de lado e se deu ao acaso da viagem. Mas nela havia aquele dote de confiança, e eu fui meramente homem, a pensar mais com as calças. Tal qual todos. Como fui estúpido. Boas moças que perdi ao longo da jornada.
            Não que eu me preze a ter saudade. Elas são passado. Muito longe de passado. Nem memória compõem elas em mim – tudo bem, uma ou outra, qual homem que não tem? – mas não é nada assim, ó, que memória, lembrançona maneira essa, bicho. Porém, ficou aquele elevado da cicatriz, que de vez em quando dá aquela dorzinha da lembrança do machucado. Boa parte das vezes essas lembranças vêm quando vejo alguns novos casais se formando e há toda aquela juventude a corroer de superficialidade – aos meus olhos – aquilo que eles julgam ser a experiência da vida deles. A descoberta é muito gostosa – quem não se lembra dela? – mas só de saber o script de todo aquele processo, já me encho de desesperança e o conselho mais estático, frio, moderno, grosso, masculino, me vem à ponta da língua. Mas o mordo, evito deixá-lo sair. Tento me contaminar com aqueles olhinhos brilhosos, vivendo uma sensação de benesse. Mas por ter casca grossa, sou de difícil contaminação.
            Aí, então, dia desses, me vem a esposa: por que você não me beija mais a mão? Você costumava beijar a minha mão. E realmente, ela entrava na sala de professores de uma escola em comum de trabalho e lá eu estava, a esticar a palma, puxar a dela e dar aquele leve beijo. Às vezes, o beijo era na testa, em sinal de respeito. Até hoje beijo a testa, como respeito. Não mais do que. E isso se dá com todo mundo. Meus amigos e amigas, principalmente. Já li estranhamento em certos olhos. Algo que pupila neles aquele argumento de loucura sobre mim, mas o que fazer? Não que eu queira ser diferente, longe disso, eu só não quero ter problemas próximos que me façam perder essa mulher que hoje tenho. Com ela me tornei pai, estou numa família que julgo sadia – loucuras todos temos, é nosso de nosso encontro – mas eu senti aquele toque do problema de antes. Disse uma vez a uma amiga literária, descobrimos que amamos quando estamos no banheiro. Você a escovar o dente e seu cônjuge no reflexo do espelho, a fazer caretas sentado no vaso, e aquilo não te incomoda. Ao contrário, alimenta um desejo pelo conhecimento àquela pessoa que faz o relacionamento se tornar duradouro. Só que houve a saudade do beijo na mão, que estou mais rápido em minhas investidas, menos preocupado, mais dorminhoco, menos homem, mais marital. Por sorte, ela me fala em tom leve, cobrando carinhosamente, esta sabe que não deixei de ser romântico, apenas adormeci o monstro-doce. Só que nós, homens, somos românticos, quando estamos à caça do bendito sovaco de coxa, do entrepernas, da danada, da perseguida – nunca gostei deste nome, mas me atém aos eufemismos que aqui quero. Logo depois dele, um abraço, somos lembrança. Eu pelo menos ligava no dia seguinte. Até fazia juras, ia um pouco mais adiante. Mas depois era como qualquer um.
            Porém, como disse, sou casado. E tenho que concordar que Deus escreve certo por linhas tortas. Não sou religioso, ou melhor, institucionalizado. Se hoje consigo chegar a mais de quatro anos casado, é porque tenho uma leve constante de romantismo em minha vida. Dormir fazendo carinho, evitar grosserias, discussões, bate-boca, isso nunca fizemos. Saber dividir o controle remoto, não deixar a lata de cerveja na pia, abaixar a bendita tampa do vaso, apertar o tubo da pasta por baixo, tirar a barba da pia, pedir licença na hora dos barulhos, um toque de romantismo moderno. E tem dado certo. Posso não ser o maior dos românticos, mas me mantenho constantemente romântico. É uma dica, para esses novos homens que por aí surgem. Pode até ser difícil e digo por experiência, ter várias mulheres numa época é muito bom, mas depois se torna um jogo vazio. Não tem coisa pior que voltar para casa sozinho, ou ser recebido pela mera escuridão de sua sala. Incomodava-me depois do triatlon – sair prum encontro, comer e depois comer – deixá-la de banho na casa dela e voltar sozinho, no perigo da madrugada carioca com cheiro de pólvora. Hoje ganho abraço de alguém que pula no pescoço e outra que abraça e diz ter aquela leve saudade. É nisso que a vida se basta.
            Por isso, digo que hoje sou irrefreavelmente romântico, na lembrança leve dessas que perdi; na certeza dessa que sempre será minha. Graças a Deus. 

domingo, 15 de agosto de 2010

Gentileza gera GENTILEZA

“Com licença!”, “Pisei no seu pé? Perdão.”, “Desculpe, está meio apertado aqui!”, “Por favor, onde fica a rua tal?”, “Bom dia, Dnª Fulana!” e por aí vai. Tá difícil ouvir essas frases ultimamente? Pois é, põe difícil nisso! Agora todo mundo se tromba no Metrô, se espreme nos elevadores, é esmagado nos ônibus, se esbarra nas ruas sem sequer olhar para o outro, que dirá ser gentil. São os tempos modernos, de muita grosseria e desrespeito, tudo computado na conta da falta de tempo, da correria cotidiana. Mas eu nunca imaginei que se precisasse despender tanto tempo para ser educado!? Quantos minutos são gastos para cumprimentar o ascensorista do trabalho ou o motorista do ônibus que se pega todos os dias? E o zelador do prédio onde se mora? Não mais que dois segundos! Acho que esse tempinho não vai fazer falta na vida de ninguém, ninguém vai chegar atrasado por isso, tampouco vai cair a língua!

E se as pessoas não se dão ao trabalho desses simples gestos verbais, quanto mais os gestos mecânicos (no sentido do movimento e não no da banalidade)? Todos já viram a seguinte situação: num transporte lotado, entra uma senhora de idade ou uma mulher grávida e os homens, sobretudo os mais jovens, ao invés de se levantarem para ceder seu lugar, FINGEM que estão dormindo. Poucos são os que ainda lembram do que lhes foi ensinado por suas mães, porque podem apostar que isso foi ensinado, só que alguns têm Alzheimmer precoce e esquecem que um dia, se Deus permitir, também precisarão dessas gentilezas, quando as pernas já estiverem fracas para suportar o peso dos anos ou a barriga da sua esposa estiver pesando demais e causando inchaço dos tornozelos. Não estou apregoando que a gente deve se “abrir” para qualquer um, nem bancar o bobo alegre e sair cumprimentando estranhos na rua, mas podemos e devemos ser gentis com os conhecidos, amigos, namorados, etc.

Os pequenos gestos de gentileza não são supérfluos ou antiquados, como atualmente se pensa, são ações que ajudam a suavizar o cotidiano e o caos do mundo; auxiliam o relacionamento humano e amenizam a dureza da vida. A pessoa que recebe esses gestos sente-se feliz, importante, valorizada como ser humano. Amiga leitora, você não se sente lisonjeada quando um homem mantém a porta aberta para você passar, ou puxa a cadeira para você sentar, ou quando ele sai do carro e abre a porta do carro para você entrar? Nããão?! Que pena, eu me sinto super envaidecida, pois são pequenos gestos de carinho e atenção que sinalizam que eu sou importante para esta pessoa. E cá entre nós, são os pequenos gestos, mais do que os grandiosos, que enternecem o nosso coração e são guardados na lembrança para os períodos de escassez. E você leitor, não gosta quando sua namorada ou esposa escolhe aquele barzinho que você gosta por causa do chopp que ela nem toma, ou quando ela lembra daquele vinho que você adora e o traz para o jantar, ou quando ela tira bem a areia dos pés antes de entrar no carro? Tenho certeza que vocês homens adorariam que nos lembrássemos desses pequenos detalhes. E não seria uma delícia ler torpedos carinhosos no celular todos os dias? Ah, se nós parássemos em todas as lojas de eletrônicos e vocês em todas as de sapatos...

E por falar em telefones, pode existir maior falta de gentileza do que não retornar uma ligação, ou um e-mail ou uma mensagem de texto? Pode? Eu não sou a dona da verdade, nem quero ser, mas já estou na estrada há algum tempo para perceber que algumas coisas não são uma questão de obrigação e sim de educação e sensibilidade. Quando eu telefono para alguém e essa pessoa não está, fica claro que eu gostaria que ela me retornasse, pois tenho algo a lhe dizer; às vezes é um assunto importante, outras é apenas saudade, outras quero saber como está aquela amiga, se ela precisa de alguma coisa. Se for e-mail (e não sendo corrente, porque isso ninguém merece, nem o seu pior inimigo!) a cortesia da resposta é ainda maior, lembre-se que quem lhe escreveu reservou minutos do seu tempo para sentar e digitar uma mensagem. No entanto, os e-mails são um caso à parte, pois às vezes a caixa postal está tão cheia que não dá pra responder à todas as mensagens, aí sejamos condescendentes. Quanto aos SMS, esses, então, deveriam ser respondidos o mais rápido possível e sempre, pois levam apenas alguns minutos e não dão trabalho nenhum. Geralmente, nós escrevemos à pessoas com as quais temos ligações afetivas ou profissionais, o que faz com que nos ponhamos no lugar de quem escreve e sintamos a desagradável sensação de ficar aguardando uma resposta; agora se você não conhece quem lhe enviou uma mensagem ou não tem o menor apreço ou respeito por quem lhe escreveu e quer que essa pessoa esqueça que você existe, aí NÃO RESPONDA mesmo! Isso vai soar como um “EU NÃO TE SUPORTO, TE DESPREZO, VÊ SE TE MANCA!”. E a frequência da ausência demonstra o grau do menosprezo dispensado, viu?

Enfim, vamos nos lembrar do profeta Gentileza e seguir seu exemplo, vamos espalhar gotas de cortesia, vamos sentir como é gratificante tratar bem as pessoas, sorrir, agradecer,cumprimentar, retribuir, ajudar, pois como dizia minha santa avó: “A gente deve tratar os outros como gostaríamos de ser tratados.” Sábio, não?

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

BIENAL DO LIVRO SÃO PAULO

Meus queridos,
hoje o meu texto saiu na página da Bienal do Livro de São Paulo - http://bienaldolivrosp.tumblr.com/ - junto com o do meu amigo e colunista aqui do Trema e do Pictorescos Marcelo Judeu.

Sábado agora, nós estaremos por lá, aproveitando essa saga bienalesca e esperando encontrar amigos por todas as partes.

Deem aquela conferida!

Beijo a todos!

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Segundas de Literatura XXVII



Continuação da Entrevista Literária da Semana Passada. Agora um tema polêmico, delicado, aqui tirado de letra. Confiram

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Curta às Quartas III




É dando que se recebe. Um título sugestivo em um bom curta, baseado no conto homônimo de José Roberto Torero. Percebam a diferença nas matizes de cores ao longo do filme, é de muito bom gosto e muito bom de se ver. Vale a pena. 



segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Segundas de Literatura XXVI



Bem, não é uma entrevista literária, mas diretamente ligada ao campo da produção literária. Paulo Tedesco faz uma bela reflexão sobre a remodelação da produção artística literária e a democratização da publicação em si. Algo que demonstra um caminho já trilhado por muitos que se veem aqui no Pictorescos ou outros grupos literários mundo afora. Essa é apenas uma parte de uma entrevista concedida para um canal online chamado MLD - Mundo Literário Digital. Vou postar alguns dos vídeos diretamente aqui no Blog pra vocês.


Ademais, reiterando, Toda Quinta feira, no site da Bienal Internacional do Livro de São Paulo, os autores do Trema estarão publicando seus textos. Fomos convidados pela própria organização da Bienal como autores que representam esse caminho natural da literatura pela internet. Deem uma passadinha lá. Aqui seguem dois sites:

http://paulotedesco.blogspot.com/ - Blog do Próprio Paulo Tedesco.

http://www.bienaldolivrosp.com.br/  - Site Oficial da Bienal do Livro de SP. É lá que encontrarão um ícone à direita do site, ao lado dos ícones do Orkut, Facebook e do Twitter. Nesse ícone laranja é que está sitiado o blog da Bienal, onde o Trema e mais outro quatro grupos literários e blogueiros assinam a semana na Bienal. Deem uma passada por lá para dar aquela prestigiada.

Quem são os outros grupos:


http://www.sobrelivros.com.br – Toda segunda-feira, a equipe do Sobre Livros nos contará um pouco mais sobre a Bienal do Livro.

http://livrosemserie.com.br/ – As meninas do Livros em Série contribuirão nas terças-feiras com posts sobre livros que viraram filmes.

http://www.fracky.com.br – A Fracky escreverá nas quartas-feiras sobre atitudes que temos no nosso dia-a-dia relacionadas ao hábito de ler.

http://www.tremaliteratura.com/ - Nas quintas-feiras, você vai se entreter com os belos (e muitas vezes divertidos) contos da equipe do Trema Literatura.

http://www.listasliterarias.blogspot.com/ - Por fim, nas sextas, a diversão e a descontração são garantidas com os posts do blogueiro Douglas do Listas Literárias.


sábado, 31 de julho de 2010

Intrusas

Foi-se assim
em corte
a lamber
minha carne
abrindo-a

Com essa sua faca
não-
cega
foi até bem ao fim
do limite que meu corpo poderia suportar

Lá dentro
intromissão
foi corte
e ponte
da certeza
de que lá sempre há de ficar

E como firmeza
em riste agonia
tornou-se eu, a mim me é eterna
essa sensação de sempre te ter aqui comigo

sexta-feira, 30 de julho de 2010

Só isso

O pior não é aceitar que já não há mais um futuro, mas sim pensar que o passado acabou e o presente já não pode mudar isto. Sumir é ser covarde, sou covarde ao não querer te ver e hipócrita ao dizer que não, não sinto mais nada. Mas será que as palavras ainda dizem mais que o coração? Ser forte não é chorar escondido e sorrir na sua presença, é apenas tentar ser forte, tentar enganar e tirar você da cabeça quando insiste em não sair do coração, é fingir jogar um jogo de paciência em que no final tudo volta ao seu lugar. Parece autêntico, verdadeiro, mas são palavras, apenas palavras. Palavras que não dizem, não expressam, não amam, nunca vão amar, eu posso dizer ao mundo que te odeio, seria a maior mentirosa, mas poderia. Para que mentir com as palavras se o sentimento não diminui com isto? Não faz sentido. Se fosse real, eu passaria as noites escrevendo tudo que poderia acontecer ou o que eu poderia sentir, mas ao invés disso, passo essas noites, pensando, pensando em como seria se você estivesse aqui, como seria se você ainda fosse meu, só meu. Ou até mesmo como seria se eu não tivesse te conhecido, e definitivamente paro de pensar, pois mesmo sem você comigo agora, prefiro assim, não me arrependo de nada.
São tristes as manhãs que prometem mais um dia sem você, são tristes as noites longas que cumprem a promessa. Mas amor não se implora, não se pede, se tem por merecimento. E não tem como eu dizer: “ei, seu bobo, será que você poderia me olhar, pois estou aqui, esmagada, com a sua presença?” ou ate mesmo: “será que você poderia me abraçar como se estivéssemos caindo de uma ponte, porque eu estou no chão com a sua presença ?” nem mesmo poderia falar: “teria como me beijar como um beijo de final de filme, porque eu estou aqui, sem saliva, sem ar, sem vida com a sua presença?” Não, melhor não, definitivamente eu nunca poderia dizer isto, são coisas que não se falam. Ate porque, amor não se pede, é uma pena!
É uma pena correr sem ter algum lugar pra chegar. É uma pena ter o coração inchado de amar sozinha, olhos inchados de amar sozinha, ser apenas alguém que constroi sonhos sozinhos. Mas não posso ligar pra você e dizer: ”estou sofrendo aqui, vamos parar de estupidez de não amar e vem logo resolver meu problema? `` Mas amor não se pede, dá raiva eu sei.
Eu esperei você desviar o olhar para eu entender que estava indo embora, esperava um ultimo abraço para perceber que não mais sentiria a sua pele macia em meus braços. Mas agora, o que seria mais triste, continuar com o que não teve um começo? Por que acabou, se ao menos começou? Eu lamento, e só. Você não imagina o quanto eu amaria ter você aqui, agora. Parecia estar numa brincadeira que tem fim. Tem fim e teve fim. E eu estou aqui, cansada de ter brincado, mas querendo mais. Quero mais com você, e aí é o meu erro, preciso esquecer dessa brincadeira que sai perdendo. E sem alguma outra saída, eu fico bem, por apenas saber que você esta bem, eu gosto muito de você, e eu nem posso mais te amar!
É como se tirassem o gosto de um doce que você amava tanto, e depois você comesse cinco desses doces seguidos, pra ver se em algum momento o gosto volta. E no final, você fica mais triste, pois percebe que independe o numero de doces que você coma, o gosto jamais vai voltar.
É triste ter tanto amor querendo escrever uma historia, mas só escrevendo um texto. É triste saber que falta algo e saber que isso não se compra, não se substitui, não se esquece, nem ao menos se implora. Mas amor, você sabe, amor não se implora. Amor se declara e sabe de uma coisa? Você sabe, você sabe!
Eu sei o quanto é cansativo correr da dor, mas pra que parar e esperá-la? Não faz sentido. Vou correr até eu não aguentar mais, e nessa hora eu burlo cada súplica do coração para que eu pare e sofra um pouquinho, um pouquinho que seja para passar.
E para que vender tanto o meu corpo e tão pouco minha alma? Porque quero você comprando o que realmente quer e não enganando querer levar na promoção. Cansei de promessas de compra e das devoluções daquilo que você não queria. Cansei de expor minha alma se no fim tudo acaba. Então, está tudo aqui, a perna, a barriga, o rosto e o enorme buraco que me deixou. Cansei de idealizar um amor que não existe, um amor que não dura pra sempre, e só por isso já não é amor. E se “nada dura pra sempre” o amor não existe. E na verdade é que nada é inteiro porque até o inteiro para ser todo precisa ter seu lado vazio.

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