quarta-feira, 16 de maio de 2012

Questionável

Hoje
a coisa tá estranha
muito
segui-me ao teclado
e ele, louco
me pediu
deixa comigo
E eu deixei
Em uma hora
assentaram-se sessenta ideias

Dessas sessenta ideias
algumas brotaram
germinaram
Aí estou
Idealizando poemas
Como reduto reduzido de grandices

Mas o que faço
nesse pois então de ideias
se não deixá-las parir sozinhas
inerentes a mim
mas e nem aí para mim

Sou um escravo 
a procura de trabalho não remunerado
deixando a discrição
por descrição
nesse ato falho de escrever
o pouco que valho.

terça-feira, 15 de maio de 2012

Por uma nova coleção


                Em minha mente, cheguei ao fim de Colecionador de Lágrimas, meu primeiro romance. Debutando com esse novo amor, tal qual um óbvio adolescente em totais descobertas, posso dizer que estou ao passo da realização. Mas por que ela não me é completa? Talvez por ser o primeiro.
                Como um produto de dois anos de trabalho eu estou muito realizado. Feliz mesmo. Não me lembro bem quando se deu a derradeira escolha por palavras. Abdicar do desenho, deixar que o tracejado fugisse de meus dedos e passar somente a desenhar palavras – no fundo, a desenhar com palavras – não posso precisar quando me houve. Só posso dizer que três fatores preponderantes: Ana Maria Machado, Chico Torres e Iron Maiden.
                Se há uma obra relevante na minha vida é Raul da Ferrugem Azul. Primeiro pelo aspecto imagético, um garoto estar tomado e ter uma ferrugem que só é vista por ele e esta rima. A rima, o som, a imagem, tudo era desenhar com palavras. Mas não saí substituindo o desenho. Até os meus dezoito anos eu desenhada todo santo dia. Nada belo, serei sincero, mas desenhava. Perfis humanos, o contorno das mãos, punhos fechados, olhos a desenhar personalidade. Com o tempo foi a poesia, mas muito pouco, diga-se de passagem, mas a houve. No Ensino Médio o gosto pela música e aí que houve o pulo do gato. Passava o dia inteiro escutando música, estudando e desenhando. Do universo Rock veio a primeira namorada; casava bem com o ritmo, personificava o metal. Pelo meu gosto à Língua Inglesa, coisa dos meus sete anos, isso lembro bem, passei a estudar letras. Mas o que eram aquelas capas do Iron, o que eram? Aquele universo sombrio, questionador de letras pulsantes, temáticas, exatas e enxutas? Foi demais para mim. Paixão eterna. Este, sim, o primeiro amor.
                Aí bati de frente com o talento vivo, enorme. No Ensino Médio mesmo conheci esse cara: Chico Torres. Introspectivo, mas com dedos soltos. Uma figura sombria, escondido atrás dos cabelos. Mesmo gosto por Rock foi a aproximação. Um dia em sua casa ele fala, Escuta essa, era ele e uma guitarra. Aí entendi o porquê de sua mão ser tão volumosa em um corpo tão magro. A sua forma de tocar guitarra, a sua simbiose era perfeita.  Eram perfeitos. Não tive como não admirá-lo. Como o faço até hoje, mesmo em nossa distância.
                Neste momento em que me surge um contraste. Tanto Ana Maria Machado, quanto Iron Maiden eram talentos distantes. Na minha família os talentosos eram os que tinham um dom e por isso inalcançáveis. Eu tinha apenas uma capacidade, uma bem leve. A amizade com Chico foi fundamental para sacramentar uma convicção, que a perseverança é a síntese de alguém que consegue. Além disso, montamos uma banda juntos, eu e ele. O nome: Death Style. Era boa, por causa dele, deixe-se isso bem claro. Porém, ali compúnhamos. Letras em inglês, uma ou outra em Português, e escrevíamos o dia inteiro. Ele me mostrou outras dele, de uma banda antes. Ótimas, “ Down in the dephts / of my angry soul / I can hear the Bells of destruction”, digo, canto-as até hoje. Quase todas. Ali descobri palavras.
                Dois outros fatores: conhecer Wagner Martins e Rômulo. O primeiro pelo seu sarcasmo, uma acidez irremediável e de uma inteligência fora de série. Nós todos estudávamos, Wagner produzia raciocínio. Ele era muito para nós, a inteligência em forma física.  Conhecê-lo foi um duplo agrado, primeiro por me colocar no lugar. Era o cara que me zoava. Na época eu não entendia, hoje sim. Também por me dizer um dia, Calixto, você é um talento sem criatividade. Não entendo isso, um cara com talento, mas sem criatividade. Nunca soube como agradecê-lo. Rômulo, pois me chamou para Ace Comics. Eu desenhava, Chico e eu escrevíamos. Quem me conhece sabe da importância e desimportância de Sarcantus.
                Agora, o Colecionador de Lágrimas.
                Tê-lo prontinho, apenas necessitando de digitação final é algo reconfortante. Já fiz aquela leitura de corte, a de adaptação, a de enxerto, de novo corte. Falta digitar. Os papéis estão amontoados. Preciso organizá-los, mas vê-lo, o livro, é tão bom. Não sei qual vai ser a receptividade. Não sei. Se será boa, se serei execrado, tudo são possibilidades. Não nego que estou em uma fase de agradar gregos e troianos. Estarei mentindo se dissesse o contrário. Gostaria sim de que todos que o lessem me dissessem gostar muito. De que cada um me viesse apontar um detalhe de belo da obra. Sabe aquela história de escrever um texto que mudasse as pessoas... pois bem, sei que não a consegui. Só modifiquei a mim mesmo. Tenho um romance escrito. Não mais do que.
                Junto-me ao Hall dos meus amigos talentosos. Não posso, porém, exigir uma cadeira nesse panteão, nem sentar ao lado deles. Posso estar na mesma sala, ver um Ulisses Mattos, um Wagner Martins, um Chico Torres, vê-los em suas excelências, em seus esplendores. O que falta mesmo, nesse momento, é coisa bem simples: continuar a coleção. Escrever. Sinto-me completo assim. E ao mesmo tempo agradecido.

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