Quinta-feira
passada era o famoso dia 20 de junho de 2013, conhecido como dia da Passeata de
um milhão de manifestantes. Havia uma felicidade coletiva, uma comoção pelas
mudanças que tanto assolam a consciência brasileira, já cansada dos feitos de
políticos salafrários. Até aí, nada de novo. Seria a primeira vez que eu
participaria de um movimento que preza melhores condições para todos, nada de
reinvindicações unilaterais, específicas. Os cartazes, plurais e aos montes,
refletiam todas as angústias, a necessidade de representação e a descrença na
atual democracia brasileira, falha, apática, permissiva e fajuta. Mas nós, os
manifestantes, atolados de esperança e zonzos entre tantas primeiras vitórias –
a queda do preço das tarifas e a mobilização para lá de bonita -, não vimos que
caminhávamos ingenuamente para um campo de guerra.
Munidos
apenas de cartazes e muito grito – as musiquinhas pareciam estar guardadas há
muito tempo nas gargantas descrentes -, os manifestantes, aos montes,
principalmente famílias, em miúdos, pessoas que nunca foram, mas que queriam
usar o exercício cívico para mostrar civismo e cidadania, lotavam as ruas do
centro do Rio de Janeiro. Eu mesmo cheguei por volta de 16h30min, comprei a
máscara do Guy Fawkes – V de Vingança – a vesti e fui me unindo ao grupo de
insurgentes. Aos poucos, encontrei pessoas, alunos, companheiros de sala de
aula, compatriotas no dever cívico por melhorias. Quando já mais próximo da
prefeitura – nosso alvo principal – lá as musiquinhas ganharam mais força, os
braços estavam mais altos e os pelos mais eriçados. Todos ríamos, pela sensação
de mudança que encontrávamos estampada nos olhos e rostos e corpos e bandeiras.
A comoção era viva. Os passos dos que chegavam tremulavam chão e bandeiras com
mais força. Até que começaram os ataques
aos manifestantes.
A
Presidente Vargas estava toda tomada por barreiras fixas ao chão. Elas, num
primeiro momento, servem para evitar que pessoas atravessem as ruas por baixo,
longe das passarelas. No entanto, ali serviu como dique para evitar a dispersão
bolheada dos manifestantes, para todos os lados. Só podíamos seguir para trás,
retornando, encontrar-nos-íamos diretamente com aqueles que queriam chegar à
Prefeitura. Passamos a correr, a colidir com todos. As nuvens das bombas de
efeito moral foram tomando o ambiente. Gás lacrimogêneo, spray de pimenta e
tiros de bala de borracha ampliavam a nossa angústia. Ali víamos a enrascada em
que entramos. Algo genial dos agentes militares da opressão governamental,
aproveitaram a oportunidade para traumatizar brasileiros de várias idades e
gerações no que diz respeito à manifestação. Helicópteros da polícia militar em
voo rasante, policiais do BOPE vinham pelas ruas paralelas, cercando os
manifestantes. Enquanto que éramos todos apenas uns acuados, que passaram a se
perder de seus companheiros, pois precisávamos nos salvar.
Já
mais a frente, os telefones não funcionavam, até possuíam sinal completo, mas
só dava para passar mensagem. Outro detalhe genial da atuação militar, pois
qualquer um consegue correr e telefonar, mas passar mensagem não. As estações
do metrô – haja vista muitos manifestantes terem comprado passagem de ida e
volta – estavam fechadas. Não conseguíamos acessar a internet, não sabíamos
quais estavam abertas. Nós, que caminhamos para mostrar nossa intenção por um Brasil
melhor, estávamos diante de nossa própria aniquilação. Eles tinham a faca e o
queijo nas mãos para oprimir o movimento e sufocá-lo em sua raiz.
Não
devemos, porém, nos intimidar. Penso que há formas de atuar nas ruas, nas
manifestações, sem que estejamos vendidos, cercados em nossa necessidade de
grandeza. Para os já acostumados, por favor, direcionem-nos, não queremos perder
a energia que nos move, mas, inclusive, não precisamos ficar vendidos no meio
de nossa atuação. O movimento é bonito demais para se perder diante do aparelhamento
governamental contra aqueles que a bancam, contra nós, os manifestantes.