sábado, 5 de setembro de 2009

Parnasiannus Cannabis

Conheci um bom amigo na época de faculdade. Seu nome: Paulo César Farias Júnior. Apesar do nome, nada de político tem. O que lhe fôra famoso era uma cabeleira não muito densa, mas uma condição única de falar. Pc trepava palavras. Somava uma à outra com uma formidável capacidade de uni-las. Nada que fosse ruim, ou deveras impossível de entender, mas se dependesse do seu dia, sua ansiedade as transformava em um único sibilo, que os mais desavisados seriam incapazes de compreender. Quando via que seria impossível dar contornos de unicidade às palavras, desrespeitando os limites de cada uma, ele recorria a um recurso para lá de terapêutico.
Judeu, amigo nosso em comum – hoje colunista Pictoresco e Trema – deu-lhe logo alcunha, Já sei como chamá-lo, Parnasianus Cannabis, e o era. Havia arte na capacidade de preparo da danada. Houve uma vez que o amigo levou uma hora fazendo o preparado terapêutico que traduzia calma às suas palavras, dava finitude, ritmo, quase que uma musicalidade imaginada. Quando Paulo se era Parnasianus, era também a mistura didática de Marx e Hobsbawn, como que sintética, direta, unicelular de pensadores ativos e vivos. Era de um sintagma para lá de bem colocado, frases ordenadas, dentes que não se colidiam, um assombro de equilíbrio. E vê-lo fazendo o preparado dava gosto. Por pouca sorte, na nossa época, os celulares já com câmeras não guardavam vídeos. Pc organizava sobre folhas purificadas a solicitada quantia. Numa outra parte, era deixada a folhinha que serviria para dar suporte ao preparado. Com um cartão plástico – Telefônicos são melhores – ele ia ritmicamente batendo até que pedaços maiores fossem reduzidos. Milimetricamente todos pareciam iguais. E Pc, como um artista que era, viu que todos estavam ajustados a um tamanho coeso, justificável, pronto para a embalagem final. Aí que entra a razão da folha purificada maior, um A4 ou ofício, não lembro bem o tamanho, mas afunilada em uma medida para lá de exata. O preparado corria para a última folhinha e dali havia o enrolo. De um dos cigarros de seu maço, ele cortava parte do filtro, e como se fosse uma máquina de fazer cigarros, Pc possuía em mãos o Mestre da Delicadeza, o Material de Amplitude de Percepção, o Controlador de Ritmo.
Acender era outra arte. Só podia tocar a parte amarela da chama. Afirmava que a azul intoxicava, e realmente acontecia. Ele possuía um isqueiro amarelo – quase como uma lembrança da chama – e acendia o preparado, dando-lhe vida. Antes de mais nada, vale a pena ressaltar que Pc não era de sorrisos pós-tragada. Segurava o que podia, olhava com serenidade que era conferida, soltava aquilo que se precisava. Eu e Judeu não éramos detentores da vontade que se resumia no preparado, mas não correríamos a uma outra sala para ficar longe do característico valor odorífero que se corria. Ali éramos os todos de sempre. Um outro amigo, Pablo Bin Laden, aquele que um dia afirmou que os EUA tomaram Bin Laden-tro, o acompanhava. Dava gosto vê-los na perfeição parnasiana daquele preparado. Era uma Arte sobre Arte, sob Arte, sobriar-te. E assim Pc era a sobriedade. Pablo era a velocidade. Mas Pablo será outro texto. Não o agora.
Dia 25 de Agosto foi seu aniversário. Ultimamente, por pura questão de tempos, venho a escrever sobre os adolescentes amigos que se migram para o adulto. Um em especial, André, também Pictoresco, afirmou sofrer da mesma síndrome de Peter Pan, e me disse que a vida é isso mesmo, medo da velhice, e por isso tornamo-nos mais sensíveis com o tempo. Pc é mais um na casa dos trintões, hoje com dois filhos, casado e morando longe, mas muito longe. Está morando em Volta Redonda, fora criado aqui pelas bandas de Araruama e está dando aula de História. Não é daqueles professores de História que usa a ciência unida com a estética do hippie. Suas roupas são normais. Sempre o vi mesmo com uma blusa pólo com marca de empresa de informática, de PCs, seu outro hobby. Sei que hoje tem uma empresa de internet – ele une PCs em Volta Redonda. Agora que está pela Cidade do Aço, unindo redes e computadores, só lhe falta unir-se aos antigos, aos do passado, que ainda dizem EU TE AMO, SEU PILANTRA, mesmo depois de tanto tempo. Feliz Aniversário, eu tenho um vasinho de planta te esperando na minha nova casa.

Nenhum comentário:

Comentário Rápido