Juro que tenho pouco a escrever sobre essa data. Há muito que não sinto mais aquela emoção em especial sobre esse período. Ano passado mesmo eu coloquei apenas uma imagem que traduzia minha total descrença sobre o período. Que ele é mais do que a religião imprime isso nós já sabemos. Só que aos poucos aprendemos que viver como pai é aprender a se despoluir. Minha filha anda vidrada com o danado do Bom Velhinho.
Primeiro, foi difícil convencê-la a tirar a famosa foto. Ela ficou com medo, fez descaso, muito chorou, correu o descorreu o shopping da maneira que quisesse. Andamos com ela, veio ao meu colo, pediu para que eu a protegesse e fui aos poucos conversando para que ela tirasse a bendita da foto. Ano passado, quando ela tinha apenas um ano, a foto foi simples. Esse ano, consciente de muito sobre o mundo, ela evitou ir vê-lo, chamou-o de feio. Minha esposa, como uma mãe zelosa que é, insistiu para que nossa filha fosse ao cara. Depois de não mais do que uma hora é que conseguimos a tal – mesmo assim, com ela ao lado, e não no colo. Mas um fato foi importante, ela foi pela insistência da mãe, eu estava mais preocupado em sair daquele shopping para lá de entupigaitado (me perdoe Drummond, mas não havia outro).
Quando depois, comigo, minha filha perguntou se eu a tinha visto com o Papai Noel, tirando foto com ele. Óbvio que disse que sim, mas aí é que o mundo se faz de epifania, ela me perguntou se estava bonita, pois queria ficar bonita só para o papai e a mamãe. Não sei se foi apenas fruto de sua inteligência ou se ela viu que eu estava aporrinhado por estar lá, mas ela captou tanto o que eu e a mãe queríamos, que tirou a foto, só por nós dois. Havia em nós, num primeiro momento, a certeza de que ela tinha se identificado com ele, viu nele uma boa pessoa, podia confiar. Porém, aquela pergunta traduzia - talvez – o que minha feição transparecia e, como pai, eu não posso mostrar essas minhas perturbações às crianças. Ali eu estava destruindo a inocência.
Depois de uma angústia e um bom aperto naquele corpinho que também me abraçava, entendi que a graça de ser pai é poder retornar, ser bobo mais uma vez, deixar que os riscos de um julgamento externo aconteçam sem que incomodem. Eu não podia mais ser apenas homem grande de poluição pseudoevolutiva e deveria ser aquele amigo de barba e bigode, que também se chama de pai, mas que deve estar no mundo para se divertir em excesso.
Já pintamos as unhas juntos, penteei as Barbies, deixo-a pentear os meus cabelos, escolher se devo ficar de barba ou não. Ela é quem me veste, diz se a blusa está legal, se posso sair com aquela calça. Numa formatura, entramos dançando, e como ela pulava. Estava linda. Foi o centro das atenções. Discutimos Peixonauta, Willa e os animais e Cocoricó. Temos até um cedê no carro para que possamos todos cantar.
Hoje, tudo que tem Noel ela grita e eu olho com o máximo de satisfação. Saio com ela atrás do cara como se buscasse doce em festa de Cosme e Damião. Um amigo lá em casa ligou para o Noel – ligou mesmo, era a esposa na verdade, mas funcionou – eu fiz cara de feliz e assustado, passei a revê-lo com bons olhos. Não podia deixar que o mundinho dela, que por pouco tempo será belo – eu aos oito descobri Noel – se desfaça só por causa da minha descrença. Agora mesmo ela está aqui ao meu lado, pedindo para eu pinte umas gravuras do seu livro com ela. Fui categórico, Você me ensina?, ela foi lá pegar uma caneta para mim, pois só havia uma. Tenho que ir, pois preciso aprender a pintar gravuras. Espero que uma dia todos vocês tenham essa chance. Feliz Natal.
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